A Casa do Povo de Vizela - uma casa à margem da ruralidade
De acordo com a lei, cada freguesia rural deveria ter uma Casa do Povo, instituição corporativa que integrava proprietários e trabalhadores rurais. Efectivamente, no princípio dos anos 60, menos de 20 % das freguesias tinham Casas do Povo. A filiação na Casa do Povo era obrigatória tanto para os proprietários como para os trabalhadores. Contudo, apenas estes últimos tinham direito a assistência médica e medicamentos e a subsídios de desemprego e de doença, concedidos pela Casa do Povo.
No entanto, surgiram Casas do Povo fora dessa ruralidade, como foi o caso de Vizela, então uma vila termal, e que me proponho analisar. Criada por alvará em 25 de Fevereiro 1944, caracteriza-se pelo desenvolvimento de aspectos ligados à defesa das terras e valores morais ligados ao espírito do mundo rural, que sempre foram uma marca do Estado Novo. Surge num período em que existem cerca de meio milhar destas instituições no território nacional, correspondente a cerca de trezentos a oitenta mil beneficiários. Estando inserida numa região termal, eram rurais a generalidade dos sócios efectivos da Casa do Povo de Vizela, pessoas que trabalhavam na terra das freguesias circunvizinhas e faziam os descontos mensais para a Casa do Povo. Para além dos aspectos já referidos no âmbito da previdência social, esta instituição desenvolvia propostas para outras iniciativas que iam ao encontro das necessidades dos sócios e da comunidade, tais como o reforço da assistência médica, a instrução primária para adultos
Com o 25 de Abril de 1974, registaram-se profundas mudanças mas no essencial mantiveram-se os pressupostos de cooperação social. Dessas mudanças, destaca-se a retracção no número de sócios, justificada pela possibilidade de integrarem a Caixa de Previdência como beneficiários, esvaziando-se desta forma da massa contributiva e de um elemento que justificava a sua actividade, neste caso, o sócio efectivo. Para a sobrevivência da Casa do Povo a partir de então, muito contribuíram as diversas direcções, bem como alguns sócios e amigos desta Casa. Com mais de seis décadas de existência, passou por várias gerações e experimentou acontecimentos de relevo para o seu historial, como a construção e inauguração do edifício sede a 14 de Outubro de 1956, após uma década de funcionamento em sede provisória. A aspiração a esse desidrato e como objectivo bem definido, ficaram bem vincados aquando da intervenção na assembleia de 31 Outubro de 1950, do então presidente Manuel João de Freitas R. Faria, comunicando aos demais, a autorização da compra do terreno para sede Casa do Povo de Vizela, por despacho do Ministro das Corporações e Previdência Social. Para a posteridade ficaram as suas convictas palavras: “...para que a casa venha a ser um centro de assistência moral e material". Naturalmente, houve períodos de dificuldades, períodos, esses, que foram ultrapassados com o empenho e dedicação daqueles que sempre estiveram presentes, como o caso do senhor Júlio César Ferreira, sócio à longa data e que contribuiu para a continuidade desta Casa, angariando sócios e evitando assim o seu encerramento.
António Fernandes Gonçalves - Licenciado em Ciências Sociais/História, aluno do Mestrado em Cultura e Poderes da Universidade do Minho